Thursday, 26 January 2012
L'Inutile Beauté - Minima Moralia - Theodor W. Adorno
Posted on 00:28 by Unknown
L'inutile beauté (1) — As mulheres de beleza excepcional estão condenadas à infelicidade. Mesmo aquelas favorecidas por todas as condições, a quem assistem nascimento, riqueza e talento, parecem como que perseguidas ou possuídas pela ânsia de destruição de si mesmas e de todas as relações humanas de que participam. Um oráculo coloca-as diante da escolha entre destinos fatais.
Ou trocam prudentemente a beleza pelo sucesso, e pagam então com a felicidade pela condição deste último; como não podem mais amar, elas envenenam o amor que lhes é votado e terminam com as mãos vazias. Ou o privilégio da beleza dá-lhes coragem e segurança para repudiar o acordo da troca. Elas levam a sério a felicidade que sua pessoa promete e não são avaras consigo mesmas encontrando na inclinação de todos a confirmação de que não precisam de dar provas de seu valor.
Em sua juventude possuem essa escolha. Isso deixa-as sem escolha: nada é definitivo, tudo pode ser imediatamente substituído. Muito cedo, sem muita reflexão, elas se casam e com isso comprometem-se com condições demasiado terra-a-terra, alienam-se em certo sentido do privilégio da infinita possibilidade, rebaixam-se à condição de seres humanos. Mas aferram-se ao mesmo tempo ao sonho infantil de onipotência com que sua vida as mistificava e — de maneira nada burguesa — não cessam de jogar fora o que amanhã pode ser substituído por algo melhor.
Esse é seu tipo de caráter destrutivo. É precisamente porque foram uma vez hors concours que ficam para trás na concorrência, a que agora se dedicam maniacamente. O gesto da irresistibilidade permanece, mesmo quando esta já se desfez; o encantamento dissolve-se no momento em que, em vez de apenas representar uma esperança, se deixa estabelecer e domesticar.
Mas quem não é mais irresistível transforma-se logo em vítima: ela se vê submetida à ordem que outrora podia ignorar. Sua generosidade é punida. A aviltada assim como a possuída são mártires da felicidade. A beleza enquadrada tornou-se entrementes um elemento calculável da existência, um mero substituto para a vida inexistente, sem jamais ir além disso no que quer que seja. Ela não cumpriu a promessa de felicidade que fez a si e aos outros.
Quem, todavia, se mantém fiel a ela assume a aura da desgraça e acaba alcançada ela própria pela desgraça. Nisto o mundo esclarecido absorveu por completo o mito. A inveja dos deuses sobreviveu a eles.
(1) Coletânea de contos de Guy de Maupassant, publicada em 1890. (N. do T.)
Theodor W. Adorno. "Minima Moralia: Reflexões a partir da vida danificada". Tradução de Luiz Eduardo Bicca e Revisão de Guido de Almeida. São Paulo, Ática, 1992, p. 150.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
0 comments:
Post a Comment